As odiadas árvores
“O que mata um jardim não é o abandono. O que
mata um jardim é esse olhar de quem por ele passa indiferente.” – Mário Quintana
1-
O
horror à árvore
É
de todos conhecida a importância das árvores para o equilíbrio do planeta, sendo
também conhecida a importância da sua presença em meios urbanos, tanto em
jardins como nos arruamentos. No segundo caso, sabe-se que as árvores
contribuem para a amenização da temperatura do ar, promovem a descontaminação
atmosférica e são propiciadoras de sombra.
Apesar
do conhecimento das virtudes das plantas ser quase generalizado, uma parte
significativa das pessoas comporta-se perante as mesmas como se nada soubesse,
agindo pensando apenas nos seus interesses materialistas de curto prazo.
Assim,
um pouco por todo o lado, assiste-se a chamadas podas radicais e a abates de
árvores a pedido de moradores, por vezes preocupados com a simples queda de
folhas. A título de exemplo, refiro o caso de um morador das Capelas que, há alguns
anos, queria abater um plátano porque o seu vizinho da frente, havia tido a
autorização para abater um para tornar possível a abertura de um portão para a
sua moradia recém- construída ou o caso, recente, de um cidadão de Vila Franca
do Campo que achava que se deviam abater um conjunto de metrosiíderos pelo
simples facto das suas flores caírem sobre os automóveis estacionados.
Quando
não está em risco a vida das pessoas ou o estrago de bens, não consigo perceber
o que leva algumas criaturas a não terem qualquer respeito pelas árvores.
Querem
sombra, querem ver as suas terras ou ruas bonitas, mas não suportam ter o
trabalho de recolher as folhas ou a as flores quando caiem.
Hoje,
em que para todos os problemas a técnica tem uma solução, pelo menos pensam
alguns, recomenda-se que as autarquias substituam as árvores existentes por
árvores plásticas, isto apenas enquanto a engenharia genética, ou outra, não
inventar árvores que não cresçam e sem folhas.
2-
Em
defesa da árvore
Alice
Moderno, conhecida pela sua luta em defesa dos animais, também não foi
indiferente às árvores de tal modo que, apesar das dificuldades momentâneas por
que passou, nunca mandou “abater e reduzir a achas uma árvore que não tenha
tido morte natural”.
Em
1940, a propósito de uma campanha movida contra os metrosíderos do “Largo 5 de
Outubro”, Alice Moderno denunciou aqueles que pretendiam dar cabo dos mesmos,
tendo afirmado que cabia a todos os que sabiam escrever “ser intérpretes
perante as pessoas de quem depende a sorte das formosas árvores que constituem
um dos patrimónios vegetais de Ponta Delgada”.
No
mesmo texto, publicado no Correio dos Açores, Alice Moderno mencionou o caso do
pianista Roger Godier e da mulher que ficaram comovidos ao assistirem ao corte
de “lindas araucárias” no Largo Almirante Dunn.
Infelizmente,
outrora como nos nossos dias, os residentes nem sempre dão valor ao que é seu.
Outra
pessoa sensível ao (mau) tratamento das árvores foi o Eng. Silvicultor e
Arquiteto Paisagista Ilídio Gonçalves. Natural de Vila Pouca de Aguiar, viveu
na Horta e em Angra do Heroísmo, tendo sido professor convidado do Departamento
de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores.
A
propósito das podas mal feitas, Ilídio Gonçalves escreveu em 1985: “Nós que
purificamos o ar poluído das ruas; nós que vos damos a sombra refrescante no
estio e o abrigo acolhedor no Inverno; nós que ajudamos a construir o vosso lar
e aquecemos a vossa lareira; nós que vos deleitamos com cores garridas e
variadas ou com aromas inebriantes …por que nos mutilais os ramos frondosos?
Por que nos crivais de feridas que apodrecem o lenho valioso? Por que nos
sangrais a seiva viçosa?”
Depois
de dar exemplos de trabalhos mal executados, o Engº Ilídio Gonçalves termina o
seu texto com o seguinte apelo: “Senhores responsáveis! Acreditem que estão
errados; procurem o auxílio e o conselho de quem sabe e pode ajudar-vos a
salvar as martirizadas árvores amigas que teimam em sobreviver!”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, nº 30399, 30 de
Julho de 2014, p.14)
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